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Filhos com microcefalia: mães são protagonistas na luta contra o Zika Vírus em pesquisa coordenada por professora da UFF



Em 2015 mais de 2 mil casos de microcefalia em recém-nascidos foram identificados em diversas regiões do país, principalmente no Nordeste, após um pico epidêmico do Zika Vírus no início daquele ano. Em função dos impactos devastadores causados nas famílias e nas crianças, no entanto, assim como da proporção com que o fenômeno mobilizou a saúde pública nacional e internacionalmente, ele permanece ainda como um desafio presente. Passados quatro anos, o tema continua sendo investigado por muitas organizações de saúde e pesquisa científica do país e fora dele.
A Universidade Federal Fluminense, por exemplo, é uma delas. Através da sua Pós-Graduação em Ciências Médicas e Patologia e da Pós-Graduação em Biologia Parasitária, a instituição integra uma equipe interdisciplinar de pesquisa, constituída por 36 profissionais, entre eles, pesquisadores da Fiocruz e da La Jolla Institute for Allergy and Immunology, da Califórnia. O grupo, que reúne infectologistas, pediatras, neurologistas e radialogistas, entre outras especialidades médicas, tem como objetivo observar se as células de defesa do organismo atuam na proteção contra a infecção ao entrarem em contato com o Zika Vírus.
A pesquisa está sendo realizada através da coleta de amostras de sangue de mães que tiveram Zika na gestação e também de seus filhos expostos ao vírus durante a gravidez. Por meio da utilização de diferentes métodos imunológicos de ponta, até o momento foi possível observar nas pesquisas que 100% das mulheres que tiveram bebês assintomáticos e 57% das mulheres que os tiveram com Síndrome da Zika Congênita (SZC) têm células imunes que respondem às proteínas do Zika Vírus. Além disso, com relação às crianças, independentemente de serem acometidas ou não com a SZC, cerca de 70% delas têm células imunes que respondem às proteínas do vírus. Portanto, segundo a coordenadora da pesquisa Claudete Araújo Cardoso, infectologista pediátrica e professora do Departamento Materno-Infantil da UFF, “a maioria das mães e filhos que foram estudados possuem células imunes aptas a responderem ao Zika Vírus, sugerindo assim que desenvolveram boa imunidade ao vírus”. 
De acordo com a coordenadora, “a comunidade científica tem recebido esses resultados com muito otimismo, uma vez que tais achados mostram que se pode desenvolver imunidade contra o Zika Vírus após o contato com ele. Tal resposta tem impacto em nível local e também nacional, pois poderemos orientar as futuras gestantes em relação à proteção conferida por infecção prévia pelo vírus, reduzindo o estresse diante da possibilidade de se ter um bebê com a Síndrome da Zika Congênita”, destaca.
Trocando em miúdos, desenvolver imunidade significa que “quando somos infectados pela primeira vez por algum microorganismo que nunca tivemos contato, o corpo reage a ele através do sistema de defesa. Em geral, elimina o microorganismo e, assim, não ficamos doentes. Mas quando esse micro-organismo se multiplica com muita rapidez, não temos tempo de combatê-lo e adoecemos. Sempre há possibilidade de reencontrarmos esse mesmo micro-organismo em algum momento da vida. Portanto, nosso sistema de defesa será capaz de nos defender de forma mais eficiente e rápida, e assim não adoeceremos mais pela mesma enfermidade porque adquirimos imunidade”, esclarece Claudete.
A médica pediatra e pós-doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas da UFF, Renata Artimos Vianna, também integra o grupo multidisciplinar acompanhando as crianças expostas ao vírus Zika durante a gestação. Segundo ela, o Projeto Zika – Huap/UFF vai além da pesquisa, “principalmente pelo caráter de assistência e informação àqueles que sofrem com a angústia de uma doença debilitante. É importante para o aluno, contribuindo no aprendizado de pesquisa científica, para o paciente, que recebe uma assistência multidisciplinar, para o hospital, que incorpora um serviço de referência e para a saúde pública, colaborando no desenvolvimento de políticas públicas de prevenção e controle de epidemias, como a do Zika. Trabalhar com a professora Claudete e sua equipe é uma experiência única para mim”, destaca.
Mas outras pessoas também têm sido fundamentais para a existência e o sucesso da pesquisa, além da equipe multiprofissional envolvida. A coordenadora Claudete destaca a importância da participação das mães no projeto: “essas crianças e suas famílias foram vítimas de uma doença muito grave e todas, sem exceção, têm plena consciência do seu papel como produtores de conhecimento acadêmico. Mais do que simplesmente ‘objetos de pesquisa’, as famílias têm se sentido participantes ativas da produção do conhecimento e esse sentimento me enche de orgulho”, comemora.
De acordo com a advogada Mayrielly Wiltgen do Nascimento, mãe de Catarina e uma das integrantes da pesquisa, desde os primeiros meses de vida da filha, a experiência tem sido muito proveitosa: “Os profissionais envolvidos estão de parabéns, sempre nos acolhendo e nos ajudando quando possível. As pesquisas são necessárias para esclarecermos as dúvidas e ajudar futuras gerações. Infelizmente, fomos nós as acometidas pela síndrome, ocasionada pela falta de estrutura e política de combate ao mosquito”.
Mayrielly, que só ficou sabendo da condição da filha no momento de seu nascimento, apesar de todas as ultrassonografias realizadas durante a gestação, em que o perímetro cefálico apresentou-se dentro do limite da normalidade, levou um grande susto após o parto: “entrei em luto profundo, luto pela perda de um filho idealizado. Levei mais de um ano para aceitar e tentar voltar, na medida do possível, à minha vida antes do nascimento dela. Aos poucos fui retomando minhas atividades, momento em que percebi que poderia ajudar outras mães na mesma situação, não apenas nas trocas de ideias, mas também na esfera jurídica. Abriu-se, então, uma nova área para minha atuação: o direito das pessoas com deficiência”.
Essa foi a maneira, segundo ela, que encontrou para aceitar a condição da Catarina: “claro que às vezes dói, sofro e choro em silêncio, mas passa... E ver a evolução dela é uma experiência marcante. Todos os dias minha filha nos surpreende com sua alegria e vontade de viver!”
Juliana Louzada, mãe do Théo Louzada, e também participante da pesquisa, teve uma experiência semelhante à de Mayrielly e só soube que teria um bebê com microcefalia três dias antes do parto: “desde então tudo mudou, surgiram dúvidas, medos e muitos desafios que nunca imaginei que conseguiria superar... Meu filho teve perda da deglutição com três meses de idade, daí tivemos que aprender a lidar com isso. Algum tempo se passou e, como já era esperado, ele não conseguiu se desenvolver conforme sua idade. Substituímos o carrinho de bebê por uma cadeira de rodas”, desabafa.
Para lidar com toda essa rotina e os desafios de se criar uma criança com as limitações de uma doença debilitante, participar da pesquisa tem sido fundamental: “logo nos primeiros dias de vida do Théo começamos o acompanhamento dele no projeto. Isso foi bem importante porque descobrimos as alterações que ele possui por conta do vírus. Ter uma equipe ótima que nos ajuda e acompanha em várias questões é muito bom”, enfatiza.
Segundo a pediatra Renata Vianna, que conheceu a maioria das crianças ainda recém-nascidas e pôde participar de muitos momentos de alegrias e tristezas, “é maravilhoso vê-las alcançar suas pequenas vitórias pessoais. Torço para que a ciência possa solucionar as perguntas ainda sem respostas, oferecendo soluções para o tratamento e a prevenção da infecção pelo vírus Zika”, conclui.

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