
"Quando cheguei à Fiocruz, pensei que seria apenas mais uma consulta. Mas, pela primeira vez, alguém se interessou de verdade em saber como eu me sentia, como era minha relação com meu corpo e como cuidava da minha saúde. Faço acompanhamento com a PrEP, com visitas regulares e exames periódicos". O relato de Lucas Oliveira, 27 anos, morador da Zona Norte do Rio de Janeiro, destaca o impacto do atendimento humanizado que recebe no Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz).
O Instituto conta com ampla experiência em pesquisas e ensaios clínicos, reunindo uma equipe qualificada e estrutura completa, que inclui consultórios médicos, laboratório com padrão internacional, centro hospitalar, suporte em tecnologia da informação e setor especializado em ética e regulação em pesquisa. Além da assistência, o INI desenvolve pesquisas avançadas por meio do Laboratório de Pesquisa Clínica em DST e HIV/Aids, que estuda novos tratamentos antirretrovirais, vacinas e estratégias preventivas como a PrEP (profilaxia pré-exposição) e a PEP (profilaxia pós-exposição), em parceria com instituições científicas de referência. O Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz), também é responsável pela produção e distribuição dos medicamentos utilizados nessas estratégias, fundamentais na chamada prevenção combinada do HIV, que visa reduzir a transmissão do vírus de forma eficaz e segura.
Para Luciana Lindenmeyer, integrante da coordenação colegiada do Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça da Fiocruz, os avanços institucionais em relação à população LGBTQIA+ são visíveis, especialmente nas ações voltadas a pessoas trans e travestis. “Temos números expressivos e um aumento da presença de pessoas LGBTQIA+ na instituição, que embora ainda não represente a diversidade que buscamos sinaliza um progresso importante. As ações formativas e os processos conduzidos pelo Comitê têm contribuído para a construção de uma cultura de respeito e representatividade dentro da Fiocruz, que, como instituição pública, deve refletir a diversidade da sociedade brasileira”, afirma.
Outra frente de atuação importante é a parceria entre o INI e o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Por meio de mutirões da Justiça Itinerante, a iniciativa tem facilitado a retificação de nome e gênero para pessoas trans, um passo fundamental na garantia de direitos e no acesso digno aos serviços públicos.

“Mais de 5,6 mil pessoas trans já foram atendidas nas comunidades da Maré e de Manguinhos. Esse serviço é essencial para garantir direitos e fortalecer o cuidado integral”, ressalta a educadora comunitária Biancka Fernandes, do INI/Fiocruz.
Redução das desigualdades em saúde
O acesso da população LGBTQIA+ aos serviços públicos está garantido pela Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, mas sua implementação efetiva ainda é um desafio. Desde 2009 a Fiocruz mantém o Comitê Pró-Equidade de Gênero e Raça, responsável por articular políticas institucionais voltadas à equidade. Em 2023, a Fundação avançou com a criação da Coordenação de Equidade, Diversidade, Inclusão e Políticas Afirmativas (Cedipa) e com o lançamento da Política de Equidade de Gênero e Étnico-Racial, construída de forma participativa a partir de demandas sociais.
Coletivos internos também têm se fortalecido nas unidades da instituição. Um marco dessa articulação foi o I Encontro REDEquidade: Fiocruz pela Diversidade e Inclusão, realizado em novembro de 2024, que reuniu cerca de 60 representantes de todo o Brasil em torno das pautas de diversidade, inclusão e enfrentamento às desigualdades.

Desde outubro de 2023, a Cedipa coordena o projeto Ações de fomento à saúde integral no território da Maré, viabilizado por emenda parlamentar. A iniciativa reúne atividades voltadas à promoção da saúde integral da população LGBTQIA+ na comunidade, com foco no cuidado, na prevenção e na garantia de direitos. Em parceria com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, a Fiocruz Brasília destinou R$ 1,4 milhão a 12 casas de acolhimento LGBTQIA+, reforçando o apoio a redes comunitárias em todas as regiões do país.
“Nossas ações reafirmam o compromisso institucional com a luta por direitos e pela visibilidade da população LGBTQIA+. É uma maneira clara de dizer que essas vidas importam, merecem respeito e devem ser plenamente reconhecidas em sua dignidade”, destaca a coordenadora da Cedipa, Hilda Gomes.
Investimento em pesquisa e tecnologia
A Fiocruz também vem contribuindo com estudos pioneiros. O TransOdara, coordenado pela pesquisadora Rita Bacuri (Fiocruz Amazônia), revelou as dificuldades enfrentadas por mulheres trans e travestis no acesso ao SUS, como o desrespeito ao nome social, mas também registrou experiências de cuidado acolhedor. “O estudo reforça a urgência de práticas que reconheçam a singularidade de cada pessoa, com empatia e compromisso”, destaca Bacuri.

Outro exemplo é a pesquisa Travestilidades Negras: Movimento Social, Ativismo e Políticas Públicas, realizada pela pesquisadora Jessyka Rodrigues da Fiocruz Piauí em parceria com o Fonatrans/RJ, que analisa as desigualdades enfrentadas por pessoas trans negras no acesso a direitos básicos como saúde, moradia e educação.
Na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), o projeto Resistência Arco-Íris resultou na criação do aplicativo Dandarah, ferramenta digital de apoio e denúncia voltada à população LGBTQIA+, desenvolvida em parceria com a Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) e a ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos).
O Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) investiga temas fundamentais como a infância e adolescência trans, os processos de revelação da identidade gay, o luto de mulheres lésbicas e a parentalidade em casais homoafetivos. A Fiocruz Pernambuco tem promovido debates sobre o envelhecimento LGBTQIA+, apontando as barreiras enfrentadas por essa população na velhice. Também vem articulando ações concretas para a inserção de pessoas trans no mercado de trabalho, com a participação de diferentes setores da unidade e de fóruns especializados. E o Instituto René Rachou (Fiocruz Minas) desenvolve o projeto IntegrAÇÃO: Advocacy, Direitos Humanos e Saúde Integral da População LGBTQIAPN+, por meio do grupo Saúde, Educação e Cidadania (SEC), com o objetivo de formar ativistas para promover mudanças institucionais e sociais.
Compromisso com a representatividade
A valorização da diversidade como um compromisso institucional tem se refletido nas ações de comunicação da Fiocruz. A campanha Fiocruz é Diversidade, conduzida pela Coordenação de Comunicação Social (CCS), tem dado visibilidade às lutas, histórias e contribuições de trabalhadores e trabalhadoras da instituição. A iniciativa envolve a produção e distribuição de materiais como cartazes, vídeos, e uma curadoria de livros da Editora Fiocruz voltadas aos direitos humanos e às políticas públicas de inclusão. O compromisso também se manifesta simbolicamente na iluminação do Castelo Mourisco, que anualmente adota as cores do arco-íris em alusão ao Dia do Orgulho LGBTQIA+, celebrado em 28 de junho.
“Ampliar a diversidade nos quadros das unidades regionais e consolidar um ambiente acolhedor e livre de LGBTfobia são metas que seguimos perseguindo. É essencial que a Fiocruz não apenas represente a diversidade, mas seja efetivamente um espaço de respeito e valorização das identidades LGBTQIA+”, defende Luciana Lindenmeyer.
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