O sequestro de um ônibus na Ponte Rio-Niterói, que assustou o país na última terça-feira, levantou o debate sobre as consequências de transtornos mentais não identificados e não tratados. Parentes de Willian Augusto da Silva, de 20 anos, afirmaram à polícia que o sequestrador sofria de depressão.
Segundo especialistas, não é possível afirmar que o rapaz realmente apresentava a doença, por não conhecerem seu quadro de saúde mental. No entanto, parentes relataram que em janeiro Willian afirmou “ouvir vozes”, situação típica de um quadro de surto psicótico, segundo os médicos.
— Um surto psicótico é uma alteração de juízo de realidade, que às vezes pode vir com alucinações. Essa situação faz com que as pessoas passem a viver com pensamentos disfuncionais. Pessoas que sofrem de estresse intenso, de transtorno bipolar, de transtornos de personalidade do tipo paranoide (paranoia), narcisista, esquizotípica ou borderline, podem ter uma propensão maior — explica Luiz Fernando Pedroso, psiquiatra da Holiste.
Para Raquel Mello, psicóloga clínica com cognitivo-comportamental, os jovens são muito afetados pelos transtornos mentais por conta da aceleração do mundo moderno:
— Existe uma pressão social que os jovens enfrentam que é bem diferente da sentida pelos nossos pais. A aceleração provocada pela internet os deixa cada vez mais ansiosos, querendo tudo ao mesmo tempo, com muita intensidade. Há também uma maior dificuldade para lidar com frustrações.
Tratamento é caminho para evitar tragédias
De acordo com o depoimento de parentes de Willian, apesar de ser “depressivo”, ele nunca recebeu tratamento médico, pois os pais achavam que não era preciso. Na visão de Luiz Fernando, esse é um erro que muitas famílias cometem, mesmo sem a intenção de errar.
— O que acontece muito e que leva a tragédias como a que assistimos é a negação do que está acontecendo. O problema está diante das pessoas e elas não querem ver ou minimizam a importância. Algumas acham que tudo não passa de um comportamento de quem quer aparecer — alerta.
O tratamento para casos de transtornos mentais é multidisciplinar e envolve terapias psicológicas e até uso de remédios. Ao apresentar sinais de que há algo errado, é importante que a família encaminhe a pessoa a um psicólogo ou psiquiatra para que haja o diagnóstico e o tratamento correto da doença. Há atendimento gratuito em Centros de Atenção Psicossocial (Caps). Algumas universidades também oferecem consultas com preços acessíveis.
Apesar de o assunto depressão ter passado a integrar rodas de conversa após o sequestro, Raquel diz que é preciso tomar cuidado ao relacionar o ocorrido com o transtorno.
— O que mais me preocupa é que o preconceito contra esta doença aumente ainda mais após um episódio como este. E que pessoas que apresentem este transtorno fiquem com medo de falar sobre ele, com receio não serem bem vistas — afirma a psicóloga.
Fonte: Jornal Extra
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